terça-feira, 31 de dezembro de 2019

O surfista cadeirante - Carlos Gerbase

Tem certas coisas na vida que valem a pena, apesar de serem potencialmente perigosas. É o que sempre pensei antes de me atirar no público durante os shows dos Replicantes. Às vezes, quando a plateia estava especialmente compacta, dava umas voltas pelo salão, deitado, erguido por dezenas de braços desconhecidos. Não pensem que esse é um ato de insensatez, ou que é tão excepcional assim. Faz parte da tradição do punk rock, que criou até um pequeno glossário para identificar as possibilidades de expressão corporal do público e dos músicos.
O pogo – que dizem ter sido inventado por Sid Vicious nos primeiros shows dos Sex Pistols – é a dança que parece uma briga, cheia de encontrões, cotoveladas e eventuais botinadas. Tudo com boa educação, pra evitar que os empurrões dessa roda punk virem briga de verdade. É muito divertido.
Recomendo. Atirar-se no público, dando um salto a partir do palco, chama-se stage diving. Aqui no Brasil, muita gente chama de mosh, mas parece que é um erro de tradução. Li recentemente que mosh é o nosso pogo. Antes de mergulhar, é bom ter certeza de que aquelas mãos erguidas vão mesmo te segurar. Recomendo. Com supervisão médica e o telefone do Samu no bolso.
Mas o movimento mais interessante é o “crowd surfing”. Surfar na multidão é estabelecer um pacto existencial com os espectadores: naquele momento não há mais distância entre o músico e a plateia. Somos todos um mesmo corpo, agradecendo aos deuses do rock’n’roll a oportunidade de fazer uma poderosa catarse coletiva, que não tem equivalente no mundo da música e da arte em geral. Também recomendo, sem contraindicações. Não exige prática nem habilidade. Só um pouquinho de coragem.
No show dos 30 anos dos Replicantes, que aconteceu no dia 9 de dezembro, pude reviver, depois de 10 anos, toda essa venerável tradição do punk rock. Claro que, aos 54, não se faz as coisas como se fazia aos 24. Mas e daí? Melhor dois minutos de surf na multidão que dois anos vendo clipes no YouTube.
Mas aquela noite especial tinha que apresentar alguma atração inédita. E ela veio durante a execução de Surfista Calhorda. De repente, olhei para a plateia e, erguido por dezenas de mãos, lá estava um cadeirante passeando pelo bar Opinião. Sorridente, provavelmente mais bêbado que os bêbados que sustentavam sua cadeira, ele erguia os braços, gritava e cantava. Depois de alguns segundos, mergulhou outra vez no oceano e não foi mais visto.
Não sei seu nome, nem de onde veio, nem se o ato foi planejado por seus amigos, ou se foi resultado de uma iluminação súbita. Mas nunca vou esquecer a imagem do surfista cadeirante. Agora posso ficar mais uma dezena de anos me preparando para um show dos Replicantes. A banda terá 40, eu terei 64, e, independentemente da idade que ele tiver, quero ver o surfista cadeirante fazer suas manobras radicais outra vez. E Porto Alegre continuará a ensinar ao mundo uma ou duas coisas sobre o sempre jovem espírito do rock’n’roll.


31/12/3013

domingo, 29 de dezembro de 2019

Coisas de cronista. - Atos Paulo (Goiânia / GO)



Um cronista que se preze deve andar com uma caderneta nas mãos para pegar qualquer pensamento que possa lhe surgir a mente, vale anotar um pensamento que puxe uma crônica futura, ou um fato que dê em crônica.
Se por ora enfrentamos o dilema da falta de assunto, que é o maior assombro da carreira de um cronista, escritor ou jornalista, outrora enfrentamos a vinda de um assunto em momento inoportuno, e eles chegam em momentos diversos. Outro dia estava no banho, quando me veio uma crônica pronta na cabeça, anotei duas palavras no espelho do banheiro e terminei meu banho, desliguei o chuveiro e corri para o quarto para conseguir voltar ao banheiro antes que as palavras desaparecessem, mas vi em rastros escorregadios por todo o espelho, minha crônica morrendo e escorrendo, por água a baixo, digo, por espelho a baixo. Num outro dia estava em um carro quando um passarinho teve o seu triste fim decretado por um para-brisa trincado, sem ter nem mesmo a chance de se espernear, e isso me despertou um sentimento de melancolia que, com os recursos necessários, renderia uma boa crônica, mas as palavras foram ficando nos quilômetros que se passaram até que eu pudesse pegar em uma caneta.
Desde então venho me prevenindo, não há nada que me separe de meu caderno da capa azul, isso tem me ajudado bastante, pode até duvidar, mas nesse momento estou escrevendo sentado no chão de um beco que nunca tinha visto.

Caliente! - Atos Paulo (Goiânia / GO)


Ela entra no quarto com seu andado sedutor, estou algemado a cama e observo a uma média distância seu quadril que oscila de um lado para o outro, passos calmos dão ao ambiente um som ora sexy, ora amedrontador de salto alto e solo de madeira.
Aos poucos aquele corpo vai se despindo, primeiro os dedos suaves passeiam pela clavícula, ela se vira de costas e a mão repousa no zíper que se esconde embaixo dos cabelos ruivos. O tecido se esgueira até o chão e repousa em seus pés, ela passa um pé sobre o amontoado preto e em seguida o outro, está de frente para mim novamente. As mãos tornam a passear pelo corpo, desta vez repousam no salto vermelho e os retiram de seus pés. Com passos silenciosos ela se aproxima ainda mais da cama até parar no tapete que fica em meus pés, dali vejo cada centímetro de sedução e sinto o cheiro de vontade no ar. Com um dedo ronda a alça do sutiã e os solta do ombro, vejo seus seios e me vejo tomado pela vontade.
Joelhos na cama, logo abaixo de minhas pernas e com o cabelo atrás do ombro, não sei se já tinha antes mas hoje notei uma pintinha preta no seio esquerdo. Com as mão e os joelhos sobre a cama se aproxima ainda mais de mim e afunda a cabeça em minha virilha, tateia-me o peito até que com o indicador encontra minha boca. Seu corpo sobre mim numa mistura de calor e arrepios, ela me beija, num instante estou ainda na cama, ofegante e suado, porém sem algemas e acordado.

Café ! - Atos Paulo (Goiânia / GO)


Parece clichê, mas devo tudo o que tenho a essa palavra ou a essa substância. Por todas as madrugadas de estudo que a cafeína entrou em meu organismo e me fez ficar “ligadão”, ou por ter sido a base econômica do país no século passado, por isso uma crônica toda dedicada ao café.
Na padaria, quando você entra o que lhe vêm a cabeça é o neguinho quente, cappuccino, pingado, expresso ou clássico. Têm também as medidas, um dedo, dois, ou meio copinho. Café, de norte a sul, ou você ama, ou odeia. Café, de manhã pra começar, de tarde pra continuar e de noite pra reanimar. Amargo, doce, com mel ou com limão, tem até quem tome frio, não existe condição.
Há quem negue, realmente pode ser um esteriótipo, mas brasileiro gosta de café, e quem não gosta, odeia. Mas o café é presente na casa de quase todos do país, e no paladar de muitos gringos para quem exportamos.
Se como visita lhe oferecerem, aceite de bom gosto, beba e saboreie e se possível peça mais um pouco. Vai com pãozinho, ou com queijo? Quem escolhe é o freguês. Aos amantes de plantão, sabemos que ele nunca falha, vira vício e desvira, tem sempre um pouco na garrafa. Se de manhã falta o pão, o que não falta é o café, então meu amigo não adianta tu negar, um café seja lá como, não se pode recusar, no interior não existe um “jeitinho educado” de rejeitá-lo. Então, vai um cafezinho?

Chora-me mar - Atos Paulo (Goiânia / GO)


As lágrimas e o mar, ambas são salgadas. Enquanto as lágrimas escorrem pelo meu rosto, meu barco escorrega pelo mar. Nem lá, nem cá, as lágrimas caem e o corpo balança, pelas lágrimas aqui estou, pelo mar, pelo amor.
O barco balança, a lágrima se lança e escorrega em direção ao chão se misturando ao mar e ao sal. Como eu queria ser aquela gota, escorregar um pouco por esse sal e me juntar a iguais, como queria ser o mar, balançar as pessoas e ter gotas que momentaneamente se juntam a mim. As lágrimas me cativam pois vêem sempre com grande emoções, o mar me cativa pois vem e sempre trás as emoções, ele vem ou eu que vou. Me sento nas casca do barco, o mar molha meu rosto, mais salgado e frio do que as lágrimas, porém menos doloroso. Se o mar me faz amor, as lágrimas me vem da perca de um amor, mas no mar eu me encontro ao passo que perco as lágrimas.
Me lanço ao mar, meu corpo agora boia literalmente sozinho, nem minha mente está mais ali e vejo tudo aquilo se resumindo, pareço mais um saco de lixo se observado aqui de cima, uma última lágrima escorre pelo olho, um fio de vida se esvaindo e indo

sábado, 28 de dezembro de 2019

Vô Sério - Luis Fernando Verissimo

O vovô era um homem sério. Não carrancudo, mas sério. Tanto que os netos fizeram uma aposta: ganharia quem fizesse o vovô rir. O local da competição seria a mesa do almoço, aos domingos, quando toda a família se reunia, com a vovó numa cabeceira e o vovô na outra. Foram estabelecidas certas regras. Para ganhar, seria preciso provocar uma gargalhada no vovô. Um sorriso não bastaria. O objetivo era uma risada. Ou para não haver duvida do que se buscava uma BOA risada.
Algumas dúvidas tiveram que ser esclarecidas antes de começar a disputa.
— Cócegas vale?
Ninguém imaginava que o vovô sentisse cócegas, mas, de qualquer maneira, cócegas foram vetadas. E anedota? Se o vovô risse de uma anedota, a vitória seria do contador ou da anedota? Decidiram permitir anedotas. Quem soubesse contar uma anedota tão bem que fizesse o vovô dar uma risada, uma BOA risada, mesmo que não fosse seu autor, mereceria ganhar.
No primeiro domingo depois da aposta o Marquinhos – segundo o consenso geral na família o mais palhaço dos netos – sentou-se à mesa fantasiado de mico, fazendo ruídos e gestos de mico e pedindo banana. Todos riram muito – menos o vovô. O vovô disse: “muito engraçado, Marquinhos. Agora tire essa roupa e coma direito”. Mais tarde o Marquinhos argumentaria que o vovô dizer “muito engraçado” equivalia a uma risada, mas seu protesto foi ignorado.
No domingo seguinte, o Eduardinho contou uma anedota.
— Sabem aquela do cara que tirou uma radiografia e o médico disse que ele precisava ser operado? O cara perguntou quanto custaria a operação e o médico deu o preço. O cara achou muito e perguntou quanto custaria um tratamento sem precisar operar. O médico deu o preço, que o cara também achou muito. Aí o médico disse: “se o senhor preferir, pela metade do preço, eu retoco a radiografia”.
Todos riram muito - menos o vovô. O vovô disse que aquela história envolvia questões muito sérias, como a saúde de um ser humano e a ética médica, e não era assunto para ser tratado na mesa, na frente das outras crianças. O Eduardinho protestou:
— Era uma anedota, vovô.
— Muito sem graça - disse o vovô.
Nas semanas seguintes, todos os netos tentaram, de um jeito ou de outro, fazer o vovô rir. Apelaram para mímica, imitações (o Tico fazia um Silvio Santos impagável), números musicais, concurso de quem chupava o espaguete mais ligeiro, tudo. E o vovô sério. Finalmente desistiram.
E no último domingo aconteceu o seguinte: a vovó sentou-se na sua cadeira na cabeceira, depois de trazer a travessa de frangos da cozinha e colocá-la sobre a mesa - e caiu da cadeira. E o vovô explodiu numa gargalhada. Uma BOA risada que não parava mais, enquanto a vovó era atendida e dizia que estava bem, que não tinha se machucado, que não se incomodassem com ela.
Depois houve controvérsia. Uns netos achavam que a vovó cair da cadeira tinha sido mesmo um acidente, outros achavam que a vovó tinha caído de propósito. Depois de tantos anos, sabia o que faria o vovô rir e dera uma mãozinha para os netos.


29 de dezembro de 2013 - da série As aventuras da família Brasil
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Modelos - Luis Fernando Verissimo



Não existe gente que tem medo de palhaço? Pois eu tenho medo de modelos. Sou provavelmente o único homem no mundo que, se um dia ficasse frente a frente com a Gisele Bündchen, sairia correndo. Não sei qual é a origem dessa fobia. Não me lembro de ter sido assustado por uma modelo, quando criança. Nenhuma modelo me fez mal, ainda. Mas elas simplesmente me apavoram. É aquele ar que elas têm.
É isso. Aquele ar de superioridade, de desprezo. Eu sei que não é comigo, que elas desprezam toda a humanidade. Mas fico apavorado assim mesmo. Uma vez assisti a um desfile de modas e, depois da passagem da primeira modelo, comecei a suar frio. Ela tinha me olhado nos olhos.
Olhado como se fosse cuspir na minha cabeça. E as outras fizeram a mesma coisa. Juro. Pedi a quem me acompanhava: “Me tirem daqui!”. Não entenderam. Perguntaram o que havia. Respondi que estava cansado de ser menosprezado daquele jeito. O desfile era contra mim! Acabei me asilando no banheiro dos homens, onde eu sabia que elas não entrariam.
Procurei ajuda psiquiátrica para o meu problema. O doutor se surpreendeu: Mas elas são tão bonitas! – É por isso, doutor. São bonitas demais. Altas demais. Tudo nelas é um exagero, uma provocação. Uma espécie de prepotência.
– Todo homem sonha em possuir uma modelo. – Meus sonhos com modelos sempre terminam da mesma maneira: eu sendo pisoteado por várias, com saltos altos. – Vou lhe receitar um calmante...
– Calmante, para minar minhas defesas, doutor? E se elas me atacarem? – O que faz você pensar que as modelos vão querer atacar você?
– E eu sei? É por isso que estou aqui!
Pouca gente sabe que, antes de entrarem na passarela, as modelos chupam um limão, para desfilar com a correta expressão de desprezo, beirando o nojo, pelos seus inferiores, começando por mim. Nunca sorriem. Alimentam-se de pequenos passarinhos, pois não têm um sistema gastrointestinal como o nosso. Só mudam de dieta na lua cheia, quando comem um homem inteiro. Aquela maneira de caminhar cruzando as pernas que só modelos têm é uma amostra do que são capazes.
Eu sei, eu sei. Meu pavor de modelos é uma fobia irracional como qualquer outra. O que não quer dizer que não seja justificado. A ameaça só existe na minha imaginação e tenho tentado vencer meu medo. Mas não tem sido fácil. Por exemplo: acabo de saber que neste exato momento está havendo um simpósio internacional de modelos, em Milão, e que o tema do simpósio é o meu pênis!

28/12/2014



Crônica de quatro faces - Antonio Prata

A primeira gaveta, a dos talheres, é a mais organizada. Divisórias separam os garfos, as facas e as colheres grandes; os garfos, as facas e as colheres de sobremesa; por fim, num escaninho perpendicular, ficam as colherinhas de café. Essa arrumação militar me traz sentimentos contraditórios. Por um lado, vendo cada coisa em seu lugar, me tranquilizo: temos aqui um lar, um teto, um ninho seguro para criar os filhos, construído dia a dia –garfo a garfo– com o suor do nosso rosto. Sei que a última frase soou meio clichê. É que o lugar comum, como a própria expressão aponta, traz o conforto do reconhecimento –e eis aí a segunda parte dos sentimentos contraditórios sugeridos pela gaveta: essa tranquilidade desperta em mim a ânsia do rebanho. Trata-se, sem dúvida, de uma gaveta totalitária. Ali dentro não há qualquer possibilidade de dissenso: uma colherinha de café que resolva fazer companhia pras facas é imediatamente reconduzida ao seu compartimento. Stalin seria um bom patrono para a primeira gaveta. Kafka saberia retratar bem seus horrores. Ou Orwell? (No fundo da primeira gaveta, através de uma pequena "Teletela", o Grande Irmão assiste a tudo.)
A gaveta de baixo é diferente. Não há divisórias. Todos se misturam. Parece uma festa. Uma festa do jet set , claro, porque ali não há sombra de padronização, cada um é único, o melhor de sua área: a faca de churrasco flerta com a espátula de silicone, o saca-rolhas conta uma piada pro descascador de cenoura, a escumadeira cochicha algo para o funil. Se a primeira gaveta veste farda, a segunda é esporte fino. Lá no fundo não há "Teletela", mas um globo de espelhos.
A terceira gaveta também é uma festa, só que mais esculhambada. Ali moram os utensílios que a gente não usa. Uma geringonça de espremer batata, colheres de pau lascadas, uma faca de pão com o cabo derretido, ancestrais garfinhos de fondue. (Nunca fizemos fondue. Será que ainda temos a panela?). Pensando bem, talvez eu esteja sendo preconceituoso: por que "esculhambada"? Talvez, festa boa, mesmo, seja a da terceira gaveta. Não aquele clima de cercadinho VIP da segunda, mas de jam session num hotel decadente. Bem mais interessante bater um papo com a faca de cabo queimado e ouvir a história de sua cicatriz do que aguentar a espátula da Spyce, no andar de cima, contar vantagens sobre seu cabo de silicone. Britney Spears, Tom Cruise e Cristiano Ronaldo estariam na segunda gaveta. Itamar Assumpção, Jacques Tati e Sócrates, na terceira.
E a quarta e última gaveta? Pois é, taí uma questão que eu nunca consegui responder. A quarta gaveta é um limbo, um "achados e perdidos" onde se misturam o manual de instruções da geladeira, uma caixa de palitos Gina, três jogos americanos (diferentes), um toco de vela, araminhos de fechar pão e uns hashis de japonês delivery ainda com telefones de sete dígitos. É como se, saindo da organização platônica da primeira gaveta, fôssemos descendo rumo à desordem, até chegar à indeterminação total, onde tudo perde o sentido. Perdoem terminar assim essa crônica natalina, sem vislumbre de manjedoura ou cheiro de panetone: mas essas gavetas, mas esse conhaque, botam a gente comovido como o diabo.

28/12/2014


Alcides Villaça em uma produção do Instituto Moreira Salles


Poema de sete faces - Carlos Drummond de Andrade

Quando nasci, um anjo torto
desses que vivem na sombra
disse: Vai, Carlos! ser gauche na vida.

As casas espiam os homens
que correm atrás de mulheres.
A tarde talvez fosse azul,
não houvesse tantos desejos.

O bonde passa cheio de pernas:
pernas brancas pretas amarelas.
Para que tanta perna, meu Deus, pergunta meu coração.
Porém meus olhos
não perguntam nada.

O homem atrás do bigode
é sério, simples e forte.
Quase não conversa.
Tem poucos, raros amigos
o homem atrás dos óculos e do bigode.

Meu Deus, por que me abandonaste
se sabias que eu não era Deus,
se sabias que eu era fraco.

Mundo mundo vasto mundo
se eu me chamasse Raimundo
seria uma rima, não seria uma solução.
Mundo mundo vasto mundo,
mais vasto é meu coração.

Eu não devia te dizer
mas essa lua
mas esse conhaque
botam a gente comovido como o diabo.

segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

Utopias e distopias - Luis Fernando Verissimo

Todas as utopias imaginadas até hoje acabaram em distopias, ou tinham na sua origem um defeito que as condenava. A primeira, que deu nome às várias fantasias de um mundo perfeito que viriam depois, foi inventada por Sir Thomas Morus em 1516.
Dizem que ele se inspirou nas descobertas recentes do Novo Mundo, e mais especificamente do Brasil, para descrever sua sociedade ideal, que significaria um renascimento para a humanidade, livre dos vícios do mundo antigo. Na Utopia de Morus, o direito à educação e à saúde seria universal, a diversidade religiosa seria tolerada e a propriedade privada, proibida.
O governo seria exercido por um príncipe eleito que poderia ser substituído se mostrasse alguma tendência para a tirania e as leis seriam tão simples, que dispensariam a existência de advogados. Mas para que tudo isto funcionasse, Morus prescrevia dois escravos para cada família, recrutados entre criminosos e prisioneiros de guerra. Além disso, o príncipe deveria sempre ser homem e as mulheres teriam menos direitos do que os homens. Morus tirou o nome da sua sociedade perfeita da palavra grega para “lugar nenhum”, o que de saída já significava que ela só poderia existir mesmo na sua imaginação.
Platão imaginou uma República idílica em que os governantes seriam filósofos, ou os filósofos governantes. Nem ele nem os outros filósofos gregos da sua época se importavam muito com o fato de viverem numa sociedade escravocrata. Em Candide , Voltaire colocou sua sociedade ideal, onde haveria muitas escolas mas nenhuma prisão, em El Dorado, mas Candide é menos uma visão de um mundo perfeito do que uma sátira da ingenuidade humana.
Marx e Engels e outros pensadores previram um futuro redentor em que a emancipação da classe trabalhadora traria igualdade e justiça para todos. O sonho acabou no totalitarismo soviético e na sua demolição. Até John Lennon, na canção Imagine, propôs sua Utopia, na qual não haveria, entre outros atrasos, violência e religião. Ele mesmo foi vítima da violência, enquanto no mundo todo e cada vez mais as pessoas se entregam a religiões e se matam por elas.
Quando surgiu e se popularizou o automóvel, anunciou-se uma utopia possível. No futuro previsto, os carros ofereceriam transporte rápido e lazer inédito em estradas magnetizadas para guiá-los mesmo sem motorista. Isso se os carros não voassem, ou se não houvesse um helicóptero em cada garagem. Nada disso aconteceu. Foi outra utopia que pifou. Hoje vivemos em meio à sua negação, em engarrafamentos intermináveis, em chacinas nas estradas e num caos que só aumenta, sem solução à vista. Mais uma vez, deu distopia.
 Utopia x Distopia - Belle Hendges

terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Embasbacados - Luis Fernando Verissimo

A versão oficial da conquista do Novo Mundo pelos europeus é que tudo começou com a chegada ao que viria a ser o México do espanhol Hernán Cortéz, que embasbacou o império asteca antes de derrotá-lo, facilmente, assoviando, nas armas. Os nativos nunca tinham visto um cavalo, o que dirá mosquetes e outros instrumentos de guerra, e sucumbiram ao poder de fogo e ao garbo dos espanhóis. O que explicaria a relativa docilidade do imperador Montezuma diante dos invasores.
Não foi bem assim. Com a esquadra de Cortéz viajou, além de um exército, um notário real, cuja função era assegurar que a posse das novas terras pela Espanha obedecesse a todos os tramites legais – da Espanha. A rendição de Montezuma fez parte do embasbacamento que precedeu a chacina. Uma cultura fundada na cerimônia como a asteca teve seu primeiro encontro com uma cultura legalista e não resistiu. Um império de gestos rígidos mostrou-se impotente diante de um império de palavras maleáveis e foi enrolado pelo jargão jurídico antes de perder a guerra e a terra.
Em toda a conquista da América repetiu-se a formalidade da leitura do “Requerimento”, que proclamava a posse da terra pela Coroa espanhola e a transformação dos nativos em seus súditos. Se os nativos não estivessem presentes na leitura do “Requerimento”, não importava: o notário estava lá e daria fé. 
Cristóvão Colombo declarou formalmente diante de índios caribenhos que tomava posse das suas ilhas para o rei da Espanha “y no me fué contradicho”, como ele mesmo escreveu depois. Argumentar que ninguém ali poderia contradizê-lo porque nenhum nativo tinha ideia do que ele estava dizendo seria apelar para o bom senso, algo sem nenhuma majestade histórica. A conquista europeia da América deixou, entre outras, a tradição da lei como instrumento de enrolação.
Em toda a América persiste a mesma divisão entre brancos e índios dos tempos de Cortéz e Montezuma. De vez em quando um se recusa a ser embasbacado e tenta contradizer a hipocrisia reinante, mas nunca vai longe. 

Asas - Luis Fernando Verissimo

Uma antiga controvérsia literária: em que tipo de inseto Kafka tinha, afinal, transformado Gregor Samsa, em A Metamorfose? Na história do Kafka, um dia Gregor Samsa acorda de um sono inquietante e se vê transformado num monstruoso... O que, exatamente? Convencionou-se que o desafortunado Gregor acordara transformado numa grande barata. Vladimir Nabokov concluiu que o inseto era um grande besouro, e estranhou que Kafka ignorasse que os besouros têm asas. Se o inseto do Kafka pudesse sair voando a história teria outro sentido. Ou mais um sentido, além de todos os outros. Nabokov dedica sua interpretação às pessoas que têm asas, mas não sabem. 
Entre as muitas interpretações de A Metamorfose a que Nabokov rejeita com mais desdém é a freudiana, segundo a qual a origem da história é a relação difícil do Kafka com seu pai, e seu sentimento de culpa. Freud era uma das principais antipatias de Nabokov. E elas não eram poucas. 
Metamorfoses atrás de interpretações, freudianas ou não, existem desde antes de Ovídio, na mitologia e na literatura. Num livro sobre o tema - chamado Fantastic Metamorphoses, Other Worlds - Marina Warner descreve, por exemplo, a transformação sofrida pela palavra e o conceito de “zumbi” através dos anos. Segundo Warner, “Zombie” apareceu em inglês pela primeira vez numa História do Brasil em três volumes escrita por Robert Southey e publicada na Inglaterra entre 1810 e 1819. Southey relata a revolta de escravos e índios contra os colonizadores, liderados por “Zombi”, que identificam com um Deus angolano, e que acaba barbaramente sacrificado no fim da revolta. 
Depois da derrota do “Zombi” descrito por Southey, que inspirou protestos e poemas na Europa, ganhou corpo a versão oficial de que “Zumbi” era o nome do Diabo na língua dos africanos, o primeiro passo para transformar o mártir não em herói venerável mas em assombração. De líder libertário de pessoas que preferiram morrer a ser escravos o nome foi lentamente se metamorfizando até significar um corpo vazio, sem emoção ou discernimento, a carcaça do que fora um dia. O zumbi de agora é o zumbi de então, vencido e eviscerado.
Numa palestra sobre A Metamorfose Nabokov não propõe nenhuma interpretação, pelo menos nenhuma com uma inegável marca pessoal. Nota certas reincidências no texto – como o número três (as três portas do quarto de Gregor, os três membros da família mais três empregados, os três hospedes com suas barbas) –, mas recomenda que não se dê muita importância à coincidência, que é mais técnica do que simbólica. A fantasia de Kafka tinha sua lógica, e o que pode ser mais lógico do que o velho trio, tese, antítese e síntese? Acima de tudo se deveria evitar qualquer mito proposto por seguidores do “feiticeiro de Viena”, que era como Nabokov chamava Freud. Para Nabokov, interpretações além da realidade do texto eram desnecessárias. Afinal, nós todos já tivemos a sensação de acordar, estranhamente, como Gregor Samsa. “Acordar como um inseto não é muito diferente do que acordar como Napoleão ou George Washington” diz Nabokov. E conta: “Um dia conheci um homem que acordou como o Imperador do Brasil”. Infelizmente, Nabokov morreu antes de poder desenvolver o personagem, que já estava pronto, com asas e tudo. 

Recitando Darío - Mario Vargas Llosa

Em minhas caminhadas matinais deste outono madrilhenho, que parece não se despedir nunca do verão, vêm-me logo à memória longos poemas de Rubén Darío que aprendi há mais de 60 anos. Onde se esconderam eles todo esse tempo? No inconsciente, segundo a descoberta (ou invenção) genial de Sigmund Freud. Naquela adolescência distante, li muito o inventor da psicanálise, estimulado pelo dr. Guerra, nosso professor de psicologia em San Marcos, que ilustrava as teorias freudianas com os romances de Dostoievski e tinha uma voz tão fraquinha que mal a ouvíamos, uma voz que parecia o trinado de um passarinho.
Não voltei a ler Freud até os anos 1960, quando, em Londres, a amizade com Max Hernández, que estava fazendo sua análise profissional no Instituto Tavistock, me ressuscitou a curiosidade por seus livros. Eram fecundos aqueles sábados londrinos que combinavam psicanálise, visitas a sebo e revolução anarquista, porque Max e eu nos reuníamos toda semana com uns anarquistas britânicos, saídos não se sabe de onde e desencantados com o Ocidente, que sonhavam que a ideologia de Bakunin e Kropotkin, morta na Europa, ressuscitaria em algum lugar distante, talvez entre o Amazonas e o Orinoco...
Descobri Darío num seminário dado por Luis Alberto Sánchez a alunos de doutorado da Faculdade de Letras, sobre quando o poeta voltou ao Peru do exílio do exílio na ditadura do general Odría, em 1955 ou 1956. Sánchez era um professor magnífico, não tão rigoroso como Porras Barrenechea (que, em suas aulas sobre fontes históricas, trazia sempre dados de pesquisas pessoais), mas ameno, estimulante, cheio de anedotas, fofocas e comentários atualizados que transformavam seu seminário em uma coisa viva, acesa. De suas aulas, saíamos correndo para a velha biblioteca empoeirada da San Marcos em busca dos livros que ele havia explicado.
Darío foi o poeta do qual mais versos memorizei naqueles anos de leituras frenéticas. Seu poema que mais admiro, Responso a Verlaine, tive de ler com dicionário à mão, para saber o significado de “sistro” (um chocalho antigo), “propileu’ (porta monumental com colunas), “canéfora” (escultura de mulher), “náiade” (ninfa das fontes), “acanto” (planta), palavrinhas misteriosas que soavam tão bonitas. Lembro-me de uma discussão apocalíptica, em Paris, com o poeta chileno Enrique Lihn, que havia publicado na revista Casa de las Américas um poema esplêndido e ferozmente injusto, zombando das princesas e dos cisnes de Darío e propondo que, armados de garfo e faca, comêssemos de uma vez por todas o cordeiro pascal... 
Lihn e muitos poetas de então se irritavam com as firulas modernistas dos poetas darianos, misturas indescritíveis de Grécia clássica e França oitocentista, urnas de cristal, violoncelos, “mãos de marquês”, senhoritas de decotes grandes e pés pequenos. Queriam que a poesia fosse menos decorativa e suntuária, que expressasse mais intimamente a existência e não se dispersasse frivolamente na adoração do francês. Equivocaram-se ao julgar Darío assim. Ele também podia ser íntimo, profundo e pessoal, como em Lo Fatal ou em Francisca Sánchez, Acompanhe-me. Essa eu cheguei a conhecer, levado à sua casinha de Las Ventas por meu professor na Complutense Antonio Oliver Belmás. Era uma velhinha imortal, miúda, magrinha, lenço na cabeça, que jamais se permitia tomar liberdades com o grande morto, chamando-o sempre de “dom Rubén”. Quando Darío partiu em sua louca aventura para os Estados Unidos, da qual não regressaria, ela voltou a seu povoado castelhano com todo o arquivo de dom Rubén. Perguntei-lhe como Darío e José Santos Chocano se davam. “Dom Rubén tinha muito medo dele”, respondeu. Dizia que “qualquer dia, ele é capaz de entrar em minha casa e matar-me”. De fato, a correspondência entre ambos está cheia de cartas nas quais o peruano Santos exigia, com ameaças de morte, que o nicaraguense Darío escrevesse artigos elogiosos sobre os livros que Santos lhe dedicava.
Darío quebrou o provincianismo que asfixiava a poesia de nossa língua, poesia que, desde os grandes tempos clássicos de Quevedo e Góngora, se havia apequenado e retraído a temas locais, e saiu para enfrentar o mundo inteiro e tomar posse dele – precisamente com aquelas mesclas e combinações que somente um homem de periferia pode fazer, alguém que, diferentemente de um poeta francês, britânico ou alemão, não escrevia condicionado pelo peso da tradição. A extraordinária liberdade e audácia com que Darío criou sua própria tradição, com essas alianças livres nas quais deuses gregos dançam o minueto com jovens coquetes dos salões do Rei Sol, libertou a poesia de língua espanhola do regionalismo e devolveu-a ao universalismo dos clássicos. 
Graças a ele, foram possíveis, em parte, as comoções telúricas e épicas do Neruda do Canto Geral, a cativante poesia de Vallejo e, no outro extremo, o internacionalismo de Borges. Este último reconheceu isso de maneira irrefutável: “Seu trabalho não terminou e nem terminará”, escreveu. “Os que alguma vez o combatemos, hoje o estamos continuando”. Por tudo isso, Sergio Ramírez titulou o excelente ensaio que lhe dedicou Darío, O Libertador.
Deslumbrado por Darío, decidi fazer minha tese de bacharelato sobre seus contos. Meus dois assessores, Luis Alberto Sánchez e Augusto Tamayo, me faziam revisar e revisar as citações e exigiam de mim precisões bibliográficas. Mas seria muito pior mais tarde, quando o orientador de minha tese de doutorado sobre García Márquez, o mestre Alonso Zamora Vicente, passou anos exigindo que eu fizesse novas correções e desse novos detalhes na tese, em intermináveis e deliciosos passeios pela Madri dos Astúrias. As teses universitárias então eram importantes; agora, não é raro que as plagiem, e os plagiadores, em vez de serem repreendidos e cobertos de vergonha, recebem desagravos e felicitações.
Durante todo meu passeio desta manhã, recitei em voz baixa Era um Ar Suave..., o poema inicial de Cantos de Vida e Esperança, e recitei pelo menos três vezes o Responso a Verlaine. Se andar mais devagar, talvez consiga recitá-lo uma quarta vez.
Em seu seminário, Luis Alberto Sánchez contou que havia comprado por alguns francos, em um livreiro de rua de Paris, o exemplar de Prosas Profanas dedicado de próprio punho por Rubén Dário a Remy de Gourmont, a quem tanto admirava. O livro não tinha indícios de haver sido folheado. Portanto, o então célebre ensaísta francês, hoje esquecido, talvez nem se houvesse inteirado da homenagem que lhe prestava, do outro lado do mundo, aquele nicaraguense desconhecido com seu livro, mais importante que todos os de Gourmont reunidos.
Não creio que, passado um século e meio, Remy de Gourmont ainda tenha muitos leitores, nem mesmo que seus livros sejam encontrados em livrarias francesas. Seu admirador distante, enquanto isso, continua sendo lido e estudado nos dois lados do oceano e, estou seguro, ganha a cada dia leitores tão apaixonados quanto eu no vasto mundo da língua espanhola. Parece então escutar o fantasma de Darío, onde quer que se encontre, que, como a travessa Eulália, ri, ri, ri... 

TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ

sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

Via-Láctea - XIII - Olavo Bilac

Laerte

“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto…
E conversamos toda a noite, enquanto
A via-láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: “Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?”
E eu vos direi: “Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas”.
– Olavo Bilac, do poema ‘Via-Láctea – XIII (1888), no livro “Antologia: poesias”. 
Kid Abelha - Ouvir Estrelas


As Mutucas - Paulo Sant'Ana



Conta a lenda que certa vez, em Farroupilha, na serra gaúcha, um prefeito baixou um decreto excêntrico, levando em conta a acirrada rivalidade existente no município entre os torcedores colorados e gremistas.
Então, o prefeito, que era fanático gremista, baixou o decreto de que todo torcedor colorado que morresse na cidade seria enterrado no cemitério local a 10 metros de profundidade.
Justificativa escrita do decreto: no fundo, no fundo, os colorados são boa gente, afirmava o prefeito.
Gargalo, como se sabe, é o colo da garrafa. O dicionário registra a palavra gargalo como garganta, obstáculo, empecilho.
Uma vez, vi uma mulher que era dada a muitas conquistas amorosas dizer o seguinte: “Vou passar a maioria dos meus namorados no gargalo, vou me dedicar doravante somente aos que ultrapassarem esse obstáculo”.
Como se nota, gargalo também quer dizer peneira.
Gozado é que o prefixo gar, a julgar pelo que estou expondo, é quase sempre ligado a garganta: é o caso de gargarejo e até de certa forma do verbo garrular, que quer dizer tagarelar, parolar, e também o indivíduo, quando é muito gabola e falador, é classificado de garganta.
Concluo me recordando de que as palavras gargalhar e garrafa derivam dessa mesma origem.
Uma vez, escrevi que a palavra sonoramente mais bela do idioma português é pirilampo. Fui investigar a fundo a origem dessa palavra e vi que piri é uma espécie de junco e que se fundiu com lampo, que quer dizer relâmpago.
Ou seja, cheguei à conclusão de que pirilampo teve origem em relâmpago quando bate no junco.
O pirilampo, portanto, é o mesmo que vagalume, mas aí já pode sobrevir outra história, afinal lume é mesmo o quê?
Ia me esquecendo de dizer que tenho horror a cobras. Não sei de onde veio a expressão cobras e lagartos: porque não tenho medo de lagartos, só de cobras. E é claro que só tenho medo de cobras porque muitas delas são venenosas.
Não sei distinguir as cobras venenosas das não venenosas. Para mim, são todas iguais: as jararacas, as corais, as cascavéis, as jiboias, todas. Por sinal, tem um ditado que acho muito interessante: “Depois que mataram a jiboia, jararaca deita e rola”. É uma festa na selva.
Eu tenho medo da cobra porque tenho medo da picada dela. A picada consiste na injeção do seu veneno.
Engraçado, há alguns animais que são venenosos mortalmente. E há animais que são venenosos mas não matam, vejam por exemplo as mutucas, insetos que quando picam a gente produzem uma dor danada, que dura uns dois minutos, mas não matam.
Mas, falando em cobras venenosas, há uma de nome exótico: a áspide.
Mas a serpente mais famosa de todas continua a ser a naja, por sinal a cobra que foi retirada de um pote por Cleópatra para suicidar-se com sua picada, depois que ela e Marco Antônio, unidos contra Roma, foram derrotados por Otaviano numa batalha final retumbantemente histórica.
Otaviano queria expor Cleópatra pelas ruas de Roma, mas a rainha egípcia optou pelo suicídio.



quarta-feira, 4 de dezembro de 2019

Raspando digitais... - Ana Barcellos

MALVADOS - ANDRÉ DAHMER



"Os corações se querem
Os corpos se pedem
As mentes não deixam

Quando algo se quebra
Por mais precioso que seja
Torna-se caco cortante

Chega de caco
Chega de sangue
Chega de talvez

Calem-se corpos
Aquietem-se corações
Escolhas sejam aceitas

Não há mais dúvidas
Nem caminhos pelos quais decidir
Agora é raspar dos dedos as digitais"

Um brinde às inimigas - Manuela Cantuária

  Duas amigas em uma mesa de bar. Uma delas ergue seu copo. "Um brinde às inimigas, que elas tenham saúde em dobro para aplaudir nosso ...