Olivia vem correndo, para na minha frente, mostra o caroço de mexerica e faz a pergunta favorita de seus dois anos e meio de vida: "Papai, o que é isso?". Quase sem tirar os olhos do jornal —com essa displicência da qual vou me arrepender muito quando ela for grande e já tiver suas próprias respostas—, digo: "É um caroço".
Olivia, porém, continua ali, ansiosa, olhando pro caroço, olhando pra mim. Óbvio, "caroço" não significa nada e ela quer, ou melhor, precisa saber que diabo de bolinha é aquela que estava dentro da fruta. Abaixo o iPad, explico que se a gente puser aquele caroço num vaso, nasce uma planta e a planta vira uma árvore e a árvore dá um monte de mexerica. Como um céu nublado se abrindo ao sol em efeito "time-lapse", a curiosidade dá lugar ao deslumbre. "Papai, vamos plantar o caroço?! Vamos plantar o caroço?! Vamos plantar o caroço?!". Vamos plantar o caroço.
Saímos pro jardim, enfiamos o caroço num pequeno vaso amarelo, onde jazem os restos semimumificados de uma violeta —e só me dou conta da encrenca em que me meti quando, de volta ao sofá, vejo minha filha acocorada, imóvel, lá fora. "Olivia, que que cê tá fazendo aí?". "Esperando a árvore."
Explico que não é assim. Que demora. Que a gente tem que regar e aguardar uns dias, mas a minha suposta calma esconde uma ponta de pânico: e se essa semente não brotar? Será, sem dúvida, a maior frustração daqueles 30 meses de vida. Ao deitar a cabeça no travesseiro, relembro minhas palavras com um eco bíblico: "Se a gente puser o caroço num vaso... aso... aso... Nasce uma árvore... ore... ore...".
São dias de angústia na alameda dos Araçás. A cada manhã, Olivia me faz ir direto do berço ao jardim. Voltando da escola, a primeira parada é o vaso amarelo. Regamos juntos. Olhamos a terra de perto, por minutos a fio. Ela metralha perguntas: que tamanho terá a árvore? Vai poder comer mexerica antes do almoço? Vai poder levar mexerica pra escola? Respondo sem olhá-la no olho.
Na terceira noite de tribulação, proponho à minha mulher um esquema fraudulento. Compramos uma muda. Plantamos na madrugada. Ou arrumamos logo uma mexeriqueira em flor, cheia de frutas, já com balanço e casa na árvore. A Julia só me faz uma pergunta: "Caso a semente não germine, será que é a Olivia quem não vai aguentar a frustração?".
Brigo com a Julia, critico sua psicanálise de botequim e viro pro lado ciente de que ela tem toda razão. Percebo que, desde o apito inicial de Brasil e Alemanha, não acalento nenhuma esperança. De lá pra cá, foi tudo 7 x 1. Sete a um na política. Sete a um na economia. Onde não tem lama, é deserto: uma aridez total. E, de uma hora pra outra, essa semente que vai virar planta que vai virar árvore que vai dar um monte de mexerica. Ou não vai?
Na quarta manhã, nem tenho coragem de ir lá fora. Abro a porta e deixo a Olivia sair correndo. Engulo a seco. Então, ouço seus gritos de euforia. Vou apressado até o vaso amarelo: ao lado dos despojos da violeta nasceu, tímida e espalhafatosa, uma maria-sem-vergonha. "Papai! Você plantou uma flor! Você plantou uma flor! Você plantou uma flor!". Olivia abraça a minha perna, dá uns pulos pela grama, depois segue pra sala, com passos decididos, para cuidar de outros assuntos.
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