domingo, 6 de janeiro de 2019

Hafisa - Luis Fernando Verissimo

O Tavinho chegou ao bar com a novidade:
– Vou me casar! 
Ouviu “parabéns” e “obas” de todos os lados. Mas não muitos. A comemoração da notícia do Tavinho só não foi maior porque todos ali sabiam que o Tavinho era um homem de entusiasmos passageiros.
– Será que vai dar certo, Tavinho?
– Vai dar certo. Com um pouco de ajuda dos meus amigos, tem que dar certo.
– E quem é a noiva? Nós conhecemos?
– Olhem essa foto dela... 
E Tavinho mostrou a foto de uma jovem oriental, envolta em véus coloridos, com olhos roxos.
– Ela    é linda!
– Não é? Se chama Hafisa.
– E como vocês se conheceram?
– Nós ainda não nos conhecemos.
– O quê?!
– Estou me dando quatro meses para nos conhecermos, mais uns três meses para iniciar o namoro e eu me converter ao islamismo, mais uns dias para acertarmos a data do casamento. Que deve coincidir com a data em que, todo os anos, o sultão recebe seu peso em ouro. 
– Como você vai conseguir se aproximar dela?
– Já tenho tudo planejado. A Hafisa é uma das 12 filhas de Hassanal Bolkiah, o sultão de Brunei. Sei tudo que Hafisa gosta de fazer nas temporadas em Londres e Paris. Sei as caridades que costuma ajudar, os lugares que costuma frequentar. Se não acontecer nenhum encontro casual num vernissage em Londres ou um desfile em Paris, parto para a fase dois da Operação Abordagem, nas barbas do sultão, em Brunei, na costa norte de Bornéu. Essa fase envolve algum risco, pois estou pensando em recorrer a uma colisão simulada entre meu barquinho e o iate do sultão.
– Mas tudo isso, Londres, Paris, Bornéu... Tudo isso custa caro.
– É aí que entra a ajuda dos meus amigos...
A proposta do Tavinho era que se formasse uma espécie de clube de investidores para financiar sua campanha de aproximação com Hafisa. Só o que Tavinho precisava era de tempo para desenvolver sua estratégia. Uma vez feita a aproximação, o resto era com ele, e Tavinho confiava no seu taco.
– Mas qual é a vantagem pra quem entra no clube? Você muito bem, levando uma vida boa num palácio de Bornéu, dormindo com a Hafisa... E nós?
– Eu mencionei que o sultão de Brunei é o homem mais rico do mundo? Quando eu fizer parte da família real de Bornéu, o que é meu é de vocês. Menos a Hafisa, claro. Eu mandarei relatórios periódicos sobre o avanço da campanha. “Já peguei na mão.” “O sultão me ofereceu um charuto.” Etc. Depois do casamento, claro, mandaremos no castelo. Cada um terá uma odalisca para coçar seu pé. 
– Tavinho... Isso está me cheirando um pouco como a Operação Costas Quentes.
– Não tem nada a ver com a Operação Costas Quentes!
Na Operação Costas Quentes o consórcio se formara para financiar Tavinho num jogo de pôquer que, sempre confiante, ele garantia que não podia perder. Confiava no seu taco. Perdera tudo.
– Qual é a diferença? 
– Nessa operação tem amor. Tem romance. Tem jardins perfumados. E tem Hafisa, com seus olhos roxos.
Mas dessa vez ninguém se convenceu.

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