Ainda existe
cigarro de chocolate? Quando eu era criança, não lembro mais em que século,
compravam-se cigarros iguais aos de verdade, em maços, com chocolate dentro em
vez de fumo. Eles também serviam para a gente brincar de adulto. Antes de
comê-los, “fumávamos” os cigarros, gesticulando com eles como gente grande,
dizendo coisas pseudoimportantes e tragando e expelindo fumaça imaginária. Nada
era mais invejável nos adultos do que a liberdade para fumar e sonhávamos com o
dia em que poderíamos assumir todas as poses de fumantes, mas fumando de
verdade.
*
Tinha um
ritual de fumantes que me fascinava. O homem tirava uma cigarreira - lembra
cigarreira? - do bolso de dentro do paletó, abria a cigarreira, escolhia um dos
cigarros enfileirados, fechava a cigarreira com um sofisticado clique, depois
batia com a ponta do cigarro no tampo da cigarreira, antes de guardá-la,
colocar a ponta compactada do cigarro nos lábios e buscar o isqueiro em outro
bolso do paletó. No dia em que eu pudesse fazer aquele pequeno teatro com
naturalidade, eu seria um homem e, mais do que isso, um homem autossuficiente e
elegante, um homem de dar inveja.
*
Outro gesto
muito adulto era, segurando o cigarro entre o dedo indicador e o médio, usar o
anular e o polegar para catar um fragmento de fumo na língua. Este eu imitava
depois de cada tragada nos meus cigarros de chocolate.
*
Um dia,
decidi que não ia esperar crescer para ficar adulto. Roubei um cigarro da minha
mãe, peguei fósforos e fui para o fundo do quintal. Bati com a ponta do cigarro
na caixa de fósforos. Acendi o cigarro. Traguei. Me sentia um ator de cinema
(naquele tempo se fumava muito nos filmes), um Tyrone Power depois de acender o
da moça, um Humphrey Bogart depois da briga. Mas a pose não durou muito. Foi
interrompida por um acesso de tosse. Era horrível, encher a boca de fumaça
daquele jeito. Nunca mais botei um cigarro na boca. Nem de chocolate.
*
Mas, sei não.
Às vezes, penso que faltou uma cigarreira na minha vida.
Malvados - André Dahmer
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