domingo, 5 de maio de 2019

Super-heróis - Luis Fernando Verissimo

O anúncio era pequeno. “Você pode ter mais poderes do que pensa” e um número de telefone. Os primeiros telefonemas só mostravam curiosidade. “Mais poderes, como?” O primeiro a aparecer no pequeno escritório olhou para todos os lados, desconfiado, fez a mesma pergunta – que história é essa de mais poderes? – e saiu. Só o quinto visitante do pequeno escritório mostrou mais do que apenas interesse. Contou que, desde criança, tinha a certeza de que conseguiria mover objetos a distância, só com a vontade.
*
– E já conseguiu? – perguntou a moça chamada Jandira, que o recebera no pequeno escritório.
– Não. É só um sentimento que eu tenho. Já estou desistindo.
– Não faça isso. Nós ajudamos você a desenvolver seu potencial. Sabe quem foi que começou aqui conosco? O Piroman.
– Quem?
– O Homem Chama. Ele passou meses em que só conseguia se transformar numa fagulha. Hoje, é famoso pela sua capacidade de autocombustão na luta contra o crime. Persistiu e hoje, com nossa ajuda, está preparando um rapaz, que se chamará Centelha, para assisti-lo na luta contra o crime.
– Vocês ensinam pessoas com poderes especiais para desenvolver talentos que desconheciam, é isso?
– É isso. Se num período de um ano não tivermos sucesso, devolvemos o dinheiro. 
– O que seria um exemplo de fracasso?
– O Suarento. Ele estava convencido de que suava tanto que poderia usar esse poder, de alguma maneira, na luta contra o crime. Não conseguiu. E nós não conseguimos encontrá-lo para devolver seu dinheiro. Pobre do Valdir. Era simpático. Nojento, mas simpático.
*
Quais seriam alguns exemplos de sucesso da empresa no ramo de produzir super-heróis? Jandira respondeu com pergunta:
– O senhor se lembra do nome de alguém com superpoderes?
– Hmm... Super-homem... Batman...
– Claro. A velha-guarda. Nem se sabe se os veteranos ainda estão em atividade. Mas e os novos? Desde o Homem-Aranha não apareceu nenhuma novidade digna de nota, Homem-Aranha, por sinal, era produto nosso. Pisaram nele na semana passada, estamos providenciando um substituto. O senhor, por acaso, não gostaria de ser o novo Homem-Aranha?
– Sofro de vertigem nas alturas. Sinto que o meu poder oculto é a telecinesia mesmo.
– Que pena.
– Posso lhe fazer um pergunta?
– Faça.
– Você falou em tentar encontrar um cliente para devolver o dinheiro dele. Notei que esse escritório tem só uma mesa e duas cadeiras duras e um ar-condicionado quebrado. Posso deduzir que vocês estão prontos para fugir da polícia assim que descobrirem essa tramoia.
– Pode. O poder da dedução é o que mais nos incomoda. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Macho Alfa - Antonio Prata

  ilustração: Adams Carvalho Anteontem, vejam só, meu pneu furou. Todos aqueles que, como eu, estão neste rolê desde as últimas décadas do s...