Paulinho da Viola - Dança da Solidão
Solidão é mágoa/ que cobre tudo/ amargura em minha boca/ morde com dentes de chumbo... (Paulinho da Viola)
O samba Dança da Solidão, de Paulinho da Viola, é uma expressão dolorida da experiência de quem está só. Nele, o compositor relaciona solidão e desilusão como se fossem duas faces da mesma moeda. Talvez ele tenha feito isso só porque gostou da rima; mas muita gente há de concordar com a associação entre os solitários e os desiludidos do amor.
Sim: o fim de uma experiência amorosa nos deixa por um tempo com um gosto de solidão na boca. E se o final não foi escolhido e sim imposto pelo(a) parceiro(a) que não nos quer mais, a amargura chega a morder. Com dentes de chumbo. Mas nem por isso devemos colocar todas as experiências de solidão na gavetinha da desilusão. Pois quem não sabe também que, mesmo no auge de um amor apaixonado, as vezes se sente saudades de um pouco de solidão? E quem nunca viveu o momento de alívio e até de euforia quando, depois de meses (ou anos) “amargando” um abandono amoroso, nos pegamos sozinhos, “cantando, sem mais nem por quê...” (isso é Chico Buarque), felizes por existir mesmo sem a presença do outro?
A solidão pode ser a condição da atividade criativa. Muitos grandes poetas foram solitários, a começar do grande Charles Baudelaire que, no século dezenove francês, inaugurou a poesia moderna. Baudelaire era solitário que gostava de andar a esmo pelas ruas, sem propósito, “catando” no meio da multidão os temas de sua poesia. É da solidão que nasce a fantasia, mãe de todos os projetos. E nasce – se vocês estiverem dispostos a isso – a abertura para o desconhecido. Para trocar uma palavrinha com quem sentou-se a seu lado no ônibus, ou no banco da praça. Para observar melhor o que acontece ao nosso redor, pois muitas vezes a companhia do outro nos deixa indiferentes aos outros.
Por fim, penso que, mais do que a falta de uma família grande ou de um parceiro amoroso, o que nos torna mais solitários – principalmente nas grandes cidades – é a desconfiança em relação aos estranhos, esses nossos semelhantes a quem nunca fomos apresentados. Minha experiência de pedestre por escolha, há mais de dez anos, me ensinou que na maior parte das vezes uma pergunta ou um pedido de ajuda dirigidos a um estranho são recebidos com simpatia e generosidade. A concorrência feroz imposta pelo capitalismo nos ensina a desconfiar de todos. Experimentem, de vez em quando, confiar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário