domingo, 7 de janeiro de 2018

Bem rápido e bem devagar - Antonio Prata

Adams Carvalho/Folhapress


Teoria da Relatividade é daqueles assuntos com os quais todo mundo finge alguma familiaridade, mas quase ninguém sabe patavinas a respeito. O tempo é relativo. Bonito. Mas o que isso significa, no frigir dos ovos? Que se você frigir os ovos com enxaqueca vai parecer que demora dez horas e se frigir com a cabeça zerada e assoviando "Vai, Malandra" parecerão dez segundos? (Aliás, alguém "frige" ovos fora da expressão "no frigir dos ovos"? Não. No frigir dos ovos, fritamos os ovos).
Na PUC eu tinha um professor de Sociologia I muito picareta; toda vez que ele era questionado por alguma contradição, vestia uma expressão de infinita profundidade e, feito um Nietzsche da Monte Alegre, crente de estar derrubando a marteladas as muralhas do senso comum, mandava: "Tudo é relativo". Pausa dramática. "Albert Einstein."
Sem pretensão de pontificar sobre física e sabendo dos riscos de cair na cova rasa da relatividade-ostentação, confesso que, nos últimos anos, tenho percebido algumas peculiaridades na passagem do tempo. Como explicar? Sinto que o tempo tem passado muito rápido e muito devagar -ao mesmo tempo.
Pense no 7x1. Parece que foi ontem que levamos aquela saraivada, que o David Luiz corria em círculos como o Louco do Mauricio de Sousa, que você voltava de um xixi perguntando "É replay?" e te respondiam, "Não, é gol, o terceiro desde que você foi fazer xixi." Eu diria que o 7x1 foi no ano retrasado, no máximo, mas já se passaram quase quatro anos e em junho tem Copa de novo -por favor, dessa vez evite a qualquer custo fazer xixi.
Agora pense nas manifestações de 2013, iniciadas apenas um ano antes da Copa de 2014. Parece que passou uma década desde que ouvimos "Não é só pelos 20 centavos!", que a PM reprimiu um punhado de barbudinhos na Consolação como se fossem os visigodos derrubando o Império Romano, que a direita e a esquerda se viram batendo boca na Paulista e os "Sem partido!" venceram os "Fascistas, golpistas, não passarão!", que os grupos de WhatsApp das famílias se tornaram o Vietnã.
É como se 2013 tivesse vindo até 2018 de charrete e 2014 de carro, pela faixa de ônibus, num domingo. O percurso de 2013 pra cá é tão lento que mesmo o impeachment, em 2016, parece ter sido há mais tempo do que a Copa de 2014. (Bem, se pensarmos nos discursos dos deputados, parece que foi em 1912).
A imagem do carro e da charrete é ruim. Penso agora num manco cuja perna direita dê passos curtinhos (é a perna 7x1) e a esquerda percorra um grande arco horizontal até chegar lá na frente (é a perna 2013). A perna do 7x1 anda só alguns centímetros cujos marcos na régua são a derrota pra Alemanha, a demissão do Felipão, o fiasco do Dunga, o sucesso do Tite.
Já a perna de 2013 percorre quilômetros da nossa história nacional e pessoal. Eleição, Dilma, Aécio, Joaquim Levy, Mercadante, Cunha, Lava Jato, "vice decorativo", "tem que estancar a sangria", impeachment, "pedofilia", "tem que manter isso aí", bate-bocas no FB, bate-bocas no grupo de WhatsApp da família, "tio Marcão saiu do grupo", "convida o tio Marcão de volta, pessoal!". "Vai pra Cuba!". "Globo fascista!". "Globo comunista!".
Estranho caminhar deste quinquênio, uma perna escrevendo uma quadrinha e a outra "Guerra e Paz". Como é possível? Expressão de infinita profundidade: "Tudo é relativo". Pausa dramática. "Albert Einstein."

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